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sábado, 31 de maio de 2014

John Fowles - O Colecionador

John Fowles - O Colecionador




O colecionador é um livro que tem inspirado suicidas, assassinos em série, sequestradores, e criminosos do pior feitio espalhados pelo mundo, mas o motivo pelo qual me inspirou tem a ver com um alcance muito mais amplo do que adorar um maluco qualquer que gosta de coligir lepidópteros e sequestrar adolescentes para trancá-las num sótão e colecioná-las como se fossem borboletas.

Basicamente o livro trata de um sequestro elaborado por Clegg e toda a perspectiva do sequestrador, desde o início da paixão por Miranda (a sequestrada), até o sequestro em si, mostrados na primeira parte do livro. A segunda é toda escrita com a perspectiva de Miranda, que escreve num diário o seu sentimento que vive no cárcere. A terceira, na perspectiva de ambos, mas narrado por Clegg, não vou contar pois estragaria o “suspense do livro”. A quarta, quase um epílogo, é tão boa que deixo uma amostra:


“Outra coisa: essa manhã, em Lewes, uma verdadeira coincidência, eu dirigia-me para a loja de flores, quando vi uma moça de calças compridas atravessar a rua. Tive um choque pensando que estava vendo um fantasma. A moça tinha a mesma espécie de cabelo, embora mais curto; enfim, era do mesmo tamanho e andava da mesma maneira. Tal e qual Miranda. Não consegui desviar os olhos dessa moça. Segui-a e vi-a entrar num grande armazém, Woolworths. Fui atrás dela e descobri que trabalha na seção de doces.

Enfim, voltei para casa com as aspirinas e as flores, ainda disposto a agir conforme planejara. Decidi pensar melhor e, entretanto, encontrei o diário.”



O inglês John Fowles, tinha 37 anos quando publicou O colecionador. Sem querer, criou a narrativa em blocos, ou seja, dividiu o livro em blocos narrativos, no caso três, e construiu para cada narrativa uma perspectiva diferente passado no mesmo tempo narrativo. A ambiguidade do texto sai reforçada, porque, ao seguirmos o tempo narrativo do bloco de Clegg criamos uma imagem de Miranda que fica totalmente desfeita quando voltamos a reler a história agora sobre a perspectiva de Miranda. No terceiro bloco voltamos a sofrer uma ruptura das nossas convicções quando lemos a perspectiva de Clegg e Miranda alteradas pelo tempo narrativo que vai e volta. São vários pontos de vista num único momento do tempo, que nos obriga a construir a verdade, a nossa verdade, ao invés de nos deixarmos seduzir pela visão do autor.
   
O colecionador não é para ser lido em papel. Alguma editora deve editá-lo em formato eletrônico, com hiperlinks para serem colocados em centenas de momentos-chaves do livro (leia agora o que Miranda pensa sobre isso) (leia agora o que Clegg pensa sobre isso).

Quando Fowles escreveu o livro, em 1963, não existiam computadores pessoais, quando mais hiperlinks, mas tenho certeza que, se estivesse vivo, iria gostar da ideia e autorizar a publicação.







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