FIMP

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Miguel Najdorf - Zurich 1953

Miguel Najdorf - Zurich 1953




Com cinco anos aprendi a jogar xadrez, com dez anos ganhei a minha primeira partida, com dezoito perdi um torneio de clube logo na primeira rodada e fiquei muito decepcionado com aquilo.



Foi exatamente nessa altura que recebi lá no Rio a visita do meu tio Lincoln Lucena, a pessoa que me ensinou a jogar xadrez, ou pelo menos mexer as peças. Meu tio é mestre no xadrez e só sua presença intimida qualquer um.  Barba grande, cabelo desgrenhado, óculos de massa, olhos penetrantes e uma postura confiante de quem sabe que é muito inteligente e carismático. Ele tinha acabado de voltar da Argentina, onde tinha ido comemorar os oitenta anos do seu amigo pessoal Dom Miguel Najdorf.


Estava encantado com Dom Miguel e as lições de xadrez que aprendeu com o Grande Mestre. Dava para ver nos olhos, brilhavam, era paixão, fogo. Meu tio e o xadrez sempre caminharam juntos não através do amor e ódio, mas através da loucura da paixão, e por isso ele era um influenciador impetuoso. A sua excitação incomum, trazia um superlativo fantasioso da realidade do xadrez que poucos ficavam indiferentes. Naquele dia trazia na mão um exemplar de Zurich 1953, assinado com dedicatória e tudo do argentino. Vendo-me desmotivado, resolveu presentear-me com o livro, mas não o autografado, em espanhol, mas sim a versão traduzida para o inglês, que era dele e tinha na mala. O melhor influenciador para a leitura de um livro vem de alguém apaixonado, que exala uma emoção intensa convincente, um entusiasmo e um desejo de que o outro leia aquilo rapidamente e se apaixone também.


Sam Reshevsky , Paul Keres , David Bronstein , Tigran Petrosian , Efim Geller , Alexander Kotov , Mark Taimanov , Yuri Averbakh , Isaac Boleslavsky , László Szabó , Svetozar Gligoric , Max Euwe , Gideon Ståhlberg , e o próprio Najdorf combateram em 1953 Zurique naquele que é considerado o mais espetacular torneio de xadrez de todos os tempos. Dom Miguel escreveu sobre isso. Enquanto jogava escrevia, enquanto escrevia jogava, com eloquência e erudição, nos dois lados da barricada, era o participante direto de um acontecimento histórico. Dom Miguel Najdorf, com este livro, tornou-se o meu Grande Mestre da literatura.



O livro não só resgatou o meu amor pelo xadrez, como também me influenciou a imaginar a literatura fora do contexto linear que estamos habituados. Uma jogada, um comentário! Não é assim a nossa vida diária?




Sem comentários:

Enviar um comentário