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Miguel Najdorf - Zurich 1953 |
Com cinco
anos aprendi a jogar xadrez, com dez anos ganhei a minha primeira partida, com dezoito
perdi um torneio de clube logo na primeira rodada e fiquei muito decepcionado
com aquilo.
Foi
exatamente nessa altura que recebi lá no Rio a visita do meu tio Lincoln
Lucena, a pessoa que me ensinou a jogar xadrez, ou pelo menos mexer as peças. Meu
tio é mestre no xadrez e só sua presença intimida qualquer um. Barba grande, cabelo desgrenhado, óculos de massa,
olhos penetrantes e uma postura confiante de quem sabe que é muito inteligente
e carismático. Ele tinha acabado de voltar da Argentina, onde tinha ido comemorar
os oitenta anos do seu amigo pessoal Dom Miguel Najdorf.
Estava encantado com Dom Miguel e as lições de xadrez que aprendeu
com o Grande Mestre. Dava para ver nos olhos, brilhavam, era paixão, fogo. Meu
tio e o xadrez sempre caminharam juntos não através do amor e ódio, mas através
da loucura da paixão, e por isso ele era um influenciador impetuoso. A sua excitação
incomum, trazia um superlativo
fantasioso da realidade do xadrez que poucos ficavam indiferentes. Naquele dia
trazia na mão um exemplar de Zurich 1953,
assinado com dedicatória e tudo do argentino. Vendo-me desmotivado, resolveu
presentear-me com o livro, mas não o autografado, em espanhol, mas sim a versão
traduzida para o inglês, que era dele e tinha na mala. O melhor
influenciador para a leitura de um livro vem de alguém apaixonado, que exala uma
emoção intensa convincente, um entusiasmo e um desejo de que o outro leia
aquilo rapidamente e se apaixone também.
Sam Reshevsky ,
Paul Keres , David Bronstein , Tigran Petrosian , Efim Geller , Alexander Kotov , Mark Taimanov , Yuri Averbakh , Isaac
Boleslavsky , László Szabó , Svetozar Gligoric , Max Euwe , Gideon Ståhlberg ,
e o próprio Najdorf combateram em 1953 Zurique naquele que é considerado o mais
espetacular torneio de xadrez de todos os tempos. Dom Miguel escreveu sobre
isso. Enquanto jogava escrevia, enquanto escrevia jogava, com eloquência e
erudição, nos dois lados
da barricada, era o participante direto de um acontecimento histórico. Dom Miguel Najdorf, com este livro, tornou-se o meu Grande Mestre da
literatura.
O livro não só
resgatou o meu amor pelo xadrez, como também me influenciou a imaginar a
literatura fora do contexto linear que estamos habituados. Uma jogada, um
comentário! Não é assim a nossa vida diária?
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