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Nuruddin Farah - Maps |
Quem gosta de reggae de raiz
conhece Marcus Garvey, o homem que influenciou o rastafári com seu
pan-africanismo. Para Marcus Garvey, o imperador da Etiópia Haile Selassie, era
um messias vivo, que iria libertar os negros africanos da América e conduzi-los
de volta à sua terra natal. Nuruddin Farah com sua trilogia Blood in The Sun
resgata as memórias de Haile Selassie, mas de uma forma muito subtil. Sem
darmos por isso, conduz-nos de volta aos tempos de conflito em África, onde a
guerra fria manipulava os Estados como se fossem opositores num jogo de Xadrez.
A guerra fria despoletou conflitos no mundo inteiro. Lembro-me da Guerra
coreana, da guerra civil chinesa, da revolução húngara, da crise dos mísseis de
Cuba, da invasão da Checoslováquia, da guerra do Vietnã, Afeganistão, Chile,
República Dominicana, Indonésia, a lista é extensa.
Blood in the Sun fala
especificamente sobre a guerra da Etiópia (URSS) e Somália (USA), em 1977, que
terminou, como sempre, sem vencedores nem derrotados, mas com muitos mortos e
feridos.
O melhor da trilogia é o seu primeiro livro Maps, e é o melhor porque mostra
a técnica da narração na segunda pessoa como poucos livros até hoje
conseguiram. Não há técnica mais intrusiva que a narração na segunda-pessoa. O
narrador parece falar com nossos miolos, com cada uma das nossas células
neuronais, conversas privadas e segmentadas, sem que tenha a nossa devida
permissão. Não queremos, não deixamos, mas mesmo assim ele penetra, dizendo
sempre você, você, tu, tu. Khrishnamurti fazia isso muito bem, mas no sentido
da interrogação. Nuruddin Farah, com seu Maps, é o mestre da afirmação. Suas
palavras aparecem de repente, em blocos de parágrafos, como se fossem narrações
pré-gravadas para explicar as imagens que passam na retina da nossa mente. O
mais assustador é quando queremos nos desligar do personagem principal Askar e
esquecer do livro, e a sua voz em off continua a ribombar você, você, tu, tu...e retornamos ao livro, mesmo contra a nossa vontade.
Para terem uma ideia ainda hoje
mantenho este livro sob o meu travesseiro.